quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

CAERN: Presidente do Comitê do Piancó-Piranhas-Açu questiona proposta do presidente do TJRN

Procópio Lucena/Reprodução
O presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica Piancó-Piranhas-Açu (CBH-PPA), Agrônomo José Procópio de Lucena, emitiu nota à imprensa em que estranha o posicionamento do presidente do Tribunal de Justiça do RN, desembargador Cláudio Santos, propondo ao governo do estado a venda da Companhia de Águas e Esgotos do RN (CAERN) como forma de restituir o dinheiro sacado da Previdência estadual, pelo governador Robinson Faria (PSD), numa entrevista concedida ao jornal Tribuna do Norte, de Natal.
Abaixo, a íntegra da nota assinada pelo presidente do CBH-PPA, publicada pela página eletrônica da entidade, com o título “Privatizar a CAERN por quê?! Água não é mercadoria”:

A intenção e preocupação do presidente do Tribunal de Justiça do RN, desembargador Claudio Santos, em entrevista ao jornal Tribuna do Norte, são justas e corretas ao cobrar do governador do estado, Robinson Faria, a recomposição financeira dos recursos sacados da previdência estadual, porém, inoportunas e injustas ao propor a venda da CAERN para suprir tal feito.  Por que será que a Tribuna do Norte deu tanta ênfase à proposta de privatizar a CAERN? Entendo que essa proposta está carregada de uma visão reducionista do papel e natureza do estado, e fortalece a proposta de racionalidade econômica, priorizando o momento de crise hídrica e a lógica da escassez de água, com o intuito de justificar a sua privatização e a da CAERN, criando uma falsa ideia de solução do problema hídrico para a população. Espero que essa proposta não encontre, por parte do governo do estado, nenhum apoio, e que haja total reprovação da sociedade potiguar. Cabe ressaltar que o acesso e o direito à água e ao saneamento foram reconhecidos, na Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU), de 28 de julho de 2010, sem nenhum voto contra, como um direito humano fundamental. Os países que se opunham como Estados Unidos, Grécia e Japão, se abstiveram. O Brasil votou a favor. Cabe reforçar que aqui, no Brasil, na perspectiva jurídica, os serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário são serviços públicos e é função do Estado garanti-los aos cidadãos. Portanto, o reconhecimento da água como um direito humano fundamental implica responsabilização do poder público pela garantia do acesso à água para todos, indistintamente, em uma base não lucrativa. Contudo, os interesses das grandes corporações que operam com o comércio da água trabalham para que, ao invés de um direito, a água seja reconhecida como uma necessidade a ser provida pela iniciativa privada e absorvida pela lógica mercantil. A água potável é um direito humano fundamental e se encontra no cerne de uma crise diária que afeta vários milhões de pessoas, principalmente as mais pobres e vulneráveis do Brasil e do mundo. A preservação do direito humano à água é um fim em si mesmo e um meio de consubstanciar as prerrogativas mais genéricas da Declaração Universal dos Direitos Humanos e outros instrumentos com vínculo jurídico, incluindo o direito à vida, à educação, à saúde e à habitação (PNUD, 2006). Em várias partes do mundo e no Brasil a mercantilização da água produz a base das novas desigualdades sociais e ambientais no acesso a este bem fundamental para a reprodução humana. Estou me referindo ao uso da água para as necessidades humanas fundamentais, tais como: beber, cozinhar, tomar banho, fazer a higiene pessoal etc. Ou seja, fala-se da água como um direito humano coletivo, direito de cidadania, que deve ser garantido a todos e a todas, relacionado a questões de saúde pública, em quantidade socialmente definida como necessária para cobrir todas as necessidades básicas de reprodução social, sem qualquer distinção de classe, cor, sexo, idade. A água, como direito coletivo, deve ser um fator de coesão social pelo fato do seu acesso expressar uma condição de igualdade de todos os cidadãos. Para esta finalidade, a água não pode ser tratada como mercadoria e, portanto, não pode ser objeto de compra e venda. Este assunto de privatização da CAERN já surgiu em outros momentos e parecia ter saído da agenda do Estado e da sociedade; no entanto, a proposta do desembargador, infelizmente, mostra que o debate não está superado. Pela expressão política e significado que tem o presidente do Tribunal de Justiça do RN é estranho e preocupante esse posicionamento público de propor e defender a privatização da CAERN. Em que interesses está assentada esta proposta? Neste contexto, é fundamental o aprofundamento da discussão em torno dos paradigmas que sustentam o atual modelo de gestão dos serviços de água e saneamento no RN, como também sobre a concepção da água-mercadoria que está na base desta proposta. Consequentemente, a sociedade deve se posicionar contra a privatização da CAERN afirmando que o acesso à água potável e segura é um direito humano essencial, fundamental e universal, porque determina a sobrevivência das pessoas e, portanto, é condição para o exercício dos outros direitos humanos. Vender a CAERN é privar principalmente os pobres do acesso à água e isto significa negar-lhes o direito à vida radicada na sua dignidade inalienável. Nesse sentido, faz-se necessário uma ampla campanha na defesa da CAERN como serviço público estatal, fundamentado na gestão pública transparente, participativa e a serviço da dignidade humana, do bem comum e da justiça intergeneracional.

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